“Nós não devemos ter a menor dúvida de que o que está em curso no país é um golpe”, enfatizou Guilherme Boulos em sua fala ocorrida na última sexta-feira, dia 15, no “Encontro pela Democracia e por mais direitos” promovido pela Fundação Lauro Campos com o apoio do Núcleo de Direitos Humanos, do Centro Acadêmico Florestan Fernandes e do Centro Acadêmico do Borba, todos da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
Para o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), é necessário se ater ao que ele chamou de o “pacote do golpe”. O projeto do Michel Temer, denominado de “Ponte para o Futuro”, é o projeto que sequer o neoliberalismo de FHC teve a ousadia de propor, “é o pacote das contrarreformas estruturais da burguesia brasileira que representa uma política de terra arrasada no país”. Em pauta, as reformas trabalhistas, entendidas como o estímulo às terceirizações, o ataque ao décimo terceiro, à licença maternidade, às férias; assim como a busca pela desindexação do aumento do salário mínimo e o esfacelamento do sistema previdenciário.
Para Boulos, Michel Temer seria o ator político ideal que poderia implementar esse pacote de reformas, já que ele “não foi eleito por ninguém e não vai pretender reeleição para ninguém. Ele não precisa prestar contas para a sociedade brasileira: ele vai precisar prestar contas para o Congresso Nacional de ratos, que significa fazer uma boa distribuição de cargos, e prestar contas para o empresariado e para a burguesia financeira do Brasil, que é quem está sustentando com sua mão invisível o golpismo”.
Continuando, apontou qual é o desafio para a esquerda que o atual cenário coloca: “é preciso identificar que há o esgotamento de um ciclo, há algo que chegou ao seu limite. Não há mais espaço para pacto conservador nesse sistema. A polarização da sociedade brasileira não é algo passageiro, e não é passageiro porque se esgotou um ciclo econômico, que é o ciclo do ganha-ganha, o ciclo da conciliação, que trouxe ganhos para os setores mais pobres deste país, é verdade, mas sem enfrentar um único privilégio da burguesia brasileira”. Boulos identificou também que há o esgotamento do sistema político brasileiro: “se há algo de progressivo na Operação Lava Jato, no meio de tanta arbitrariedade e abuso, é que ela demonstrou aquilo que a esquerda brasileira diz há 30 anos: que este sistema político é refém dos negócios privados, comandado por uma lógica de financiamento de campanha que faz com que o Estado brasileiro sirva aos mesmos donos, independentemente de quem ganha”.
Sobre as saídas possíveis para esse cenário, são duas: “a saída à direita para o esgotamento do sistema político é este processo de impeachment e o ‘neoparlamentarismo’ que já falam por aí. A saída à direita para o esgotamento da política do ganha-ganha é a austeridade e a retirada dos direitos sociais”.
Já saída à esquerda, defendida por ele, “é propor uma inversão do ajuste fiscal, é retomar a pauta das nossas reformas estruturais, é colocar o tema tributário, é colocar o tema da dívida pública. É trazer esse debate de forma viva. Porque se a gente ficar a vida inteira dizendo que não tem correlação de força para fazer, a gente nunca vai construir a correlação de força para fazer”.
A saída à esquerda para o esgotamento do sistema político brasileiro é radicalizar a democracia: “vamos falar de uma democracia que não seja controlada pelo poder econômico. Vamos falar de uma democracia que tenha participação popular efetiva nas decisões não só de quatro em quatro anos no voto, que tenha instrumentos de participação popular que assegure a participação das mulheres, que assegure a participação dos negros. Falemos de uma democracia que não seja uma democracia racista que extermina a juventude negra, que não seja uma democracia machista que impede o direito das mulheres sobre seu corpo, que não seja uma democracia homofóbica que bloqueia o direito à diversidade sexual, vamos falar de democracia de verdade”.
“Eles estão passando uma ideia que o governo Temer é um governo de pacificação nacional, baseados na ideia de que terão maioria parlamentar. Nós temos que furar isso: pode ter governabilidade no parlamento, mas não terá governabilidade nas ruas”, encerrou Guilherme Boulos.