Juliana de Souza Oliveira¹ & Rafael Moreira²
No dia 8 de março comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Porém, a escolha desta data não se deu por acaso. A data é comumente conhecida por homenagear as operárias atingidas por um incêndio em uma fábrica têxtil enquanto reivindicavam melhores condições de trabalho. Há diversas versões deste episódio, mas o fato é que a decisão da ONU em oficializar a data em 1921 vem do acúmulo de lutas e reivindicações que as mulheres travaram a longo de todo século XX. Para além de um dia de homenagens, como é visto por muitos nos dias de hoje, a data tem também um significado simbólico bastante forte, de lembrar a todas e todos as lutas históricas que as mulheres têm travado para reivindicar igualdade de gênero, cabendo a nós então aproveitarmos a data para recapitularmos esse histórico de lutas pela igualdade de direitos em nosso próprio país.
No Brasil, o ano de 1932 é considerado a data que marca o direito feminino ao voto. A data é considerada um marco histórico fundamental nas conquistas femininas, e que em nosso país se deu muito antes de países ditos “desenvolvidos” e que muitas vezes são tomados como exemplos de democracias consolidadas, tal como França (1944) e Suíça (1971). Contudo, a letra da lei não acompanhou a realidade dos fatos.
Entre 1932 e 1955 as mulheres foram apenas 30% dos eleitores registrados, o que se dava pelo fato do voto ser facultativo às mulheres casadas. Elas não eram obrigadas a fazer o título de eleitora, nem a votar. Assim, o que se dava na prática com o voto facultativo era uma permissão para que as mulheres ficassem à mercê de seus maridos no momento de participar politicamente. No limite, o acesso à esfera pública era concedido com a autorização do espaço privado, ou seja, do chefe da família.
Apesar de muita coisa ter mudado naquele período, com um maior ingresso das mulheres no mercado de trabalho e o aumento significativo do seu grau de escolaridade, por incrível que pareça o voto somente passou a ser obrigatório a ambos os gêneros, equiparando os direitos políticos de homens e mulheres, em 1965. Por consequência, se levarmos em conta então que durante todo o regime militar não houve eleições diretas para o cargo máximo do nosso governo, o de Presidência da República, isso significa que as mulheres votaram pela primeira vez para Presidente nos mesmos termos que os homens somente há 29 anos, há menos tempo que a promulgação da nossa Constituição.
Em se tratando do exercício de cargos políticos a disparidade se torna ainda maior. Entre 1933 e 1964 o Brasil elegeu somente 4 deputadas e durante a Constituinte de 1946 nenhuma mulher foi eleita. Ainda hoje as mulheres são menos que 10% dos parlamentares. Em uma perspectiva comparada, entre 140 países analisados pela ONU, o Brasil está no 108º lugar em relação à representação da mulher no Parlamento. Em termos gerais pode-se dizer que avançamos no quesito representação, é verdade, mas ainda hoje os partidos sistematicamente desrespeitam a lei de cotas de no mínimo de 30% de candidaturas femininas, assim como distribuem de maneira bastante desigual os recursos disponíveis para campanhas eleitorais.
Por todos esses aspectos, no dia 8 de março as mulheres reivindicam, acima de tudo, que suas vozes sejam ouvidas. Que elas possam estar nos espaços deliberativos para pensar e construir junto com os homens um diálogo onde o gênero não seja o critério para decidir se uma opinião merece ou não ser ouvida. Um dia de se lembrar que há um longo caminho a ser percorrido, inspirando-se na coragem daquelas que ao longo da história lutaram por igualdade de condições.
[1] Mestranda em Ciência Política pela USP, pesquisadora do Núcleo de Estudos Comparados Internacionais (NECI), e bacharel em Ciências Sociais.
[2] Doutorando e Mestre em Ciência Política pela USP. Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais pela mesma Universidade.