Francisvaldo Mendes*

No dia primeiro de abril de 2018 ocorreu o segundo turno das eleições presidenciais na Costa Rica. A chapa do PAC – Partido da Ação Cidadã – venceu as eleições com mais de 60% dos votos. O presidente eleito, Carlos Alvarado, traz em sua chapa, como vice, uma mulher negra: a economista Epsy Campbell. A formação da chapa foi fruto de um processo de debates que envolveu o educador e sindicalista Marvin Rodriguez como possível vice até a decisão. Fabrício Alvarado, ex-deputado e bispo evangélico foi derrotado em uma eleição na qual temas polêmicos e contemporâneos como direitos trabalhistas, direitos humanos, religião e casamento de pessoas do mesmo sexo ganharam notoriedade.

De um lado estava um jovem de 38 anos, cientista político, roqueiro, com uma mulher, economista, negra (a primeira vice-presidente negra da América Latina). Do outro estava um pastor, conservador, que se posicionava fortemente contrário ao casamento de pessoas do mesmo sexo e o direito ao aborto. As chapas polarizaram nesse debate e a polarização pendeu favorável a posição mais libertária, democrática, com corte claro pela convivência. Ainda que no primeiro turno a chapa do PRN – Partido da Restauração Nacional – tenha ficado à frente, foi derrotado no desfecho final do segundo turno.

Questões fundamentais estavam colocadas no processo eleitoral. De um lado um discurso fundamentalista de um Bispo neopentecostal que afirmava defender o seu país de todas as influêncis malignas: aborto, homossexuais, casamento gay, direitos individuais múltiplos. Do outro uma chapa com um discurso contemporâneo sobre liberdade e direitos. A chapa, para além do homem branco que a dirigia, contava com uma mulher negra e antenada para questões do momento.

O clima não poderia ser outro: o país se dividiu. Mas não se tratava de apenas uma divisão local que dizia respeito somente a Costa Rica. Trata-se de questões fundamentais que envolvem todas as pessoas, em especial as latino-americanas e, entre essas, e especialmente, os brasileiros, nesse momento peculiar que atravessamos.

Apesar de nenhum debate de fôlego sobre o capitalismo ou sobre um projeto político revolucionário que colocasse a centralidade do trabalho e a questão avassaladora do lucro acima da vida, tratam-se de questões fundamentais para o momento político atual. Mesmo com a baixa participação do eleitorado no primeiro turno, com uma taxa de abstenção que superou os 33%, a votação que colocou o pastor à frente de Carlos Alvarado, com 24,8% contra os 21,6% do candidato do PAC, indicava uma vitória conservadora. Isso não ocorreu, o conservadorismo foi derrotado eleitoralmente na Costa Rica, fazendo com que o discurso em defesa da “família, princípios e valores”, não se materializasse em apoio popular eleitoral, o que nos traz um alento de esperança e otimismo para o Brasil.

Essa é a terceira eleição do país que foi resolvida em dois turnos. Enquanto o pastor comemorava sua colocação afirmando os valores mais reacionários e que facilmente seriam tratados como fascistas, o segundo lugar apostou na convivência, no diálogo e no respeito às diferenças. Foi justamente o chamado no sentido contrário do autoritarismo, das interdições, das criminalizações, que pulsavam na narrativa de Carlos Alvarado.

Mesmo se levando em conta que o PAC conseguiu eleger apenas 10 dos 57 congressistas, ficando para o PLN – Partido Liberación Nacional – 17 cadeiras e para o PRN – Partido da Restauração Nacional – 14 cadeiras. Fato esse que trará grandes dificuldades políticas de governança, mas, mesmo com tais obstáculos e desafios que serão apresentado pela composição do Congresso, pode-se afirmar que o resultado eleitoral foi uma expressiva vitória. Não foi uma viótira da esquerda, do socialismo, ou de um programa que coloque em xeque o capitalismo. Mas foi uma vitória fundamental pois serviu para se impor como barreira ao vulto fascista que se multiplica em toda a América Latina, América do Norte e Europa.

Não há dúvidas que que a mobilização popular assumirá lugar central para manter um governo que se sustente aos vários ataques reacionários. Com um Congresso formado majoritariamente por liberais, conservadores e uma direta das mais retrógradas, que infla o sentimento de ódio, serão forjadas ações serão permanentes para desestabilizar o novo governo eleito. Corre-se o risco, inclusive, de manipulações para armações de Golpe contra a chapa eleita, tendo em vista que essa é uma das tônicas da política nos últimos anos.

Trata-se de pensar, sentir e atuar nesse contexto com solidariedade, apoio crítico e fortalecimento.do símbolo da vitória e da chapa que chega ao posto de presidente. Para além de derrotar eleitoralmente o conservadorismo, pela primeira vez, na América Latina e Caribe, uma mulher negra assume o lugar de vice-presidente. E nós só podemos estender as mãos, conhecer e atuar para fortalecer esse processo. Nos caberá atuar para garantir uma unidade que possa fortalecer a derrota das influencias fascistas e apresentar inspirações socialistas e libertárias, na composição das mobilizações da Costa Rica e em toda América Latina. Essas são ações fundamentais e de grande importância para os trabalhadores de todo mundo.

Para além disso, vamos os nutrir dessa potência inspiradora que vem da Costa Rica para fortalecer a chapa presidencial com a qual disputaremos as eleições no Brasil. Apresentamos um jovem que luta por moradia e uma vice que defende os povos indígenas, sustentados na defesa dos direitos e comprometidos com o enfrentamento das desigualdades. Esperamos que possamos empolgar, ganhar as eleições e derrotar o sentimento perverso de ódio que tenta influenciar um povo alegre e de luta, que constrói, diariamente, as bases do nosso país.

*Francivaldo Mendes é presidente da Fundação Lauro Campos