por Marcio Rosa *

 

Dois fatos marcaram a conjuntura política do país na última semana: as massivas manifestações do dia 15 contra a reforma da Previdência e a divulgação da segunda lista de Janot. Esses apontam para uma maior dificuldade do governo e retomada do protagonismo popular, dentro de um quadro de muita instabilidade, assim como mais dificuldade para a candidatura de Lula.

O golpe foi levado a cabo para permitir a realização das reformas, em especial a reforma trabalhista e previdenciária. Depois de um momento de reorganização, as forças populares retomam o protagonismo e enfrentam o governo golpista e suas reformas. Grandes manifestações em diversos estados, amplas paralisações, inclusive dos transportes, fizeram do dia 15 um grande dia para a luta dos trabalhadores, um momento de força em uma conjuntura tão adversa.

O ato em SP teve como um dos oradores o ex-presidente e candidato a candidato à Presidência da República, o Lula. Pouco depois de depor como réu na Operação Lava Jato e de receber o apoio de intelectuais e artistas à sua candidatura, foi falar em uma manifestação onde contava com grande apoio. Mas não empolgou, mesmo assim. Até porque era um ato de protesto, não um comício.

A luta contra a reforma não pode ser instrumentalizada em favor de uma candidatura. Há, inclusive, muita contradição nessa defesa, pois Lula foi o primeiro a realizar uma reforma da previdência atacando o funcionalismo público e abrindo caminho para outros ataques aos direitos dos trabalhadores.

A tática da esquerda para o próximo período não deve começar pelos nomes. O que precisamos é de um programa popular de combate à crise, onde os mais ricos paguem a conta, e que possa contribuir para um processo de reorganização da esquerda. O “programa” que Lula apresenta é insuficiente: já que está ruim com Temer, vamos voltar com Lula. Mas as condições são outras, e ele não diz como vai fazer em tempos de vacas magras, muito menos reconhece os limites de seu governo anterior.

A candidatura de Lula, nesse momento, sequestra o futuro. Primeiro, porque a premissa de que ele é o único que pode vencer a direita é questionável. Tem muito apoio mas também muito telhado de vidro, e está sendo bombardeado faz tempo. Segundo porque sufoca a renovação e o debate sobre programa. Terceiro, porque não oferece muito mais que um programa liberal com preocupações sociais, agora em condições econômicas muito mais difíceis. Por fim, impede a crítica aos governos petistas e não reconhece os limites do reformismo de baixa intensidade.

A ideia de uma reforma da Previdência pegou muito mal entre os trabalhadores. Mesmo com toda a imprensa fazendo propaganda a favor, a reforma é altamente impopular. É hora de intensificar as ações contrárias, sempre em amplo diálogo com a população. É a pauta do momento, onde devemos concentrar nossos melhores esforços.

Ao mesmo tempo a Operação Lava Jato se intensifica com a divulgação da lista de Janot. Há um terremoto de grandes proporções na política nacional. Para os socialistas, cabe pedir a mais ampla investigação para todos os envolvidos, mesmo que nesse caso específico se reconheça a seletividade da OLJ.

A lista de Janot implica nomes do PT, em especial o ex-presidente Lula. Pode ser um caminho para impedir que ele se candidate. Mas também acerta o governo golpista, com diversos denunciados ocupando ministérios centrais, assim como os presidentes da Câmara e do Senado. Pode inclusive contribuir para diminuir o ímpeto do governo em fazer reformas que retiram direitos.

O cenário de dificuldade é agravado pela situação econômica difícil e pelos ajustes recessivos. A carestia e a dificuldade vão se ampliar com a queda do emprego e da renda. Os trabalhadores não podem pagar pela crise. Medidas como a taxação de grandes fortunas, reforma tributária e diminuição dos juros reais são alternativas à ortodoxia neoliberal que quebrou diversos países e puniu os trabalhadores.

O foco da luta política no próximo período deve ser barrar as reformas, onde há ampla unidade e fragilidades do governo golpista. Em paralelo, atuar no processo de reorganização da esquerda e de construção coletiva de uma plataforma dos trabalhadores para superar a crise. A candidatura de Lula, nesse sentido, só atrapalha.

 

* Marcio Rosa é sociólogo e diretor da Fundação Lauro Campos